Casual ou Hardcore?

Por Danilo Viana.

Desde o lançamento do Nintendo Wii, uma distinção entre os jogos surgiu. Na verdade, ela sempre esteve lá, mas ninguém nunca havia prestado atenção antes do primeiro console com controle de movimentos: falo da distinção entre jogos casuais ou hardcore.

Junto com esta diferença, surgiram os “lados”: pessoas que gostam de um estilo e não do outro, além de  contundentes opiniões a respeito do assunto e um aproveitamento das grandes empresas de console do momento em suas campanhas de marketing. Mas, ao prestar atenção a estes termos – casual e hardcore – não paro de pensar que todo mundo entendeu errado o que eles realmente significam, inclusive Nintendo, Sony e Microsoft.

Penso que a forma como estas definições têm sido contextualizadas hoje, costumeiramente acabam não refletindo  seu verdadeiro significado. Exemplos são fartos, revistas e sites classificam jogos como sendo casual ou hardcore baseados em conceitos não ligados ao tema, como o nível de violência, a qualidade gráfica ou o nível de perícia exigida para jogar. Decidi então falar um pouco sobre o assunto, mostrar minha opinião do que são “jogos casuais” e “jogos hardcore”; e a melhor forma de começar é tentando definir o que as palavras significam dentro do contexto dos videogames.

Um jogo é casual quando é possível jogá-lo dispondo-se de pouco tempo, esporadicamente e ainda assim obtendo uma experiência completa. Um jogo de baralho como UNO é casual, você pode terminar uma partida em 10 minutos ou menos e terá jogado uma partida completa do jogo.

Já um game hardcore exige dedicação e tempo por parte do jogador. Não é possível completar uma partida em poucos minutos e ter uma experiência completa. Acredito que o termo venha da expressão “jogador hardcore”, que é aquele cara (ou garota) que dedica com bastante frequência várias horas do seu dia ao videogame. Um exemplo é um jogo de RPG, que raramente pode ser terminado antes de se dedicar entre 20 e 30 horas.

Acredito que estas definições são bastante completas e fáceis de entender, mas há um problema – elas têm sido extrapoladas por quem as utiliza. Note que, da forma como defini os termos, não há qualquer menção ao nível técnico exigido para jogar, à quantidade de violência e muito menos aos gráficos do jogo – estes fatores nada têm a ver com as definições de casual e hardcore. Mesmo assim, vejo estas características sendo utilizadas todo o tempo para classificar jogos como se estivessem em um dos “lados”, trazendo um estereótipo equivocado na maioria das vezes.

Vejamos como exemplo o famoso Street Fighter 2. É possível terminar o jogo e enfrentar M. Bison em cerca de 15 minutos e uma partida multiplayer pode durar no máximo pouco mais de 3 minutos (cada partida dura 99 segundos). Ora, ele possui todas as características de um jogo casual. Quando apresento esta idéia a alguém costumo ser prontamente rechaçado com um “você é louco, um jogador casual não sabe jogar Street Fighter”. Bem, sinto muito por essas pessoas mas eu mesmo sou um jogador casual de Street Fighter. Tenho SF4 em casa, mas jogo muito de vez em quando, dedicando cerca de 30 minutos no máximo a ele, mas me considero um jogador muito bom. Vejam bem, a habilidade necessária para jogar Street Fighter nada tem a ver com ser casual ou não, um jogador casual pode ser o melhor jogador de todos os tempos, mesmo dedicando apenas alguns minutos àquele jogo.

Agora vejamos Mario Galaxy para Nintendo Wii: ele pode levar cerca de 10 horas para ser terminado, mais que isso se o jogador quiser pegar todas as estrelas. Uma partida rápida de 10 minutos raramente é suficiente para terminar uma fase, quanto mais o jogo inteiro, logo espera-se que o jogador dedique bastante tempo a ele. Parece um jogo bem hardcore para mim, mas apesar disso muitos jogadores ficam presos ao fato que Mario Galaxy é um jogo colorido, com pouca violência e feito pela Nintendo, característas que nada têm a ver com ser casual ou hardcore.

Acredito que a confusão aumentou quando surgiu o próprio Wii e seus jogos “casuais”. É fato, muitos jogos que usam o Wiimote são preparados para serem jogados em curtos espaços de tempo, tornando-os casuais. Além disso, a primeira leva de jogos também eram bem fáceis, principalmente o Wii Sports, por isso acredito ser esta a causa da confusão. Jogadores associaram casual com fácil e a própria Nintendo anuncia seus jogos como para a família, fáceis de pegar e jogar, ou seja, “casuais”.

A verdade é que acredito que a Nintendo falhou neste ponto – a característica que seus jogos têm não os torna casuais (na verdade não os torna “apenas” casuais), mas sim familiares. Jogos de Nintendo são “para a família”, o que significa que podem ser jogados pela família inteira, do vovô ao netinho. Normalmente um jogo para família é casual mas isso não é obrigatório – o jogo The Sims acredito ser um grande exemplo de um jogo familiar hardcore: ele é fácil de jogar e na verdade grandes fãs dele são não-gamers – mães, pais, etc. Mesmo assim, ele requer grande dedicação e tempo investido, o que o torna hardcore. Já pararam para pensar? Sua mãe pode ser uma jogadora hardcore.

Claro que um jogo casual ou hardcore pode ser usado de forma diferente. No caso de jogos casuais, certos títulos podem precisar de pouca dedicação para curtir em um nível básico, mas exigem anos de treino para jogar num nível profissional – são os fáceis de aprender e difíceis de dominar. Creio que o exemplo mais claro de tais jogos são os shoot’em ups, ou jogos de nave – nascidos na era arcade e feitos para serem jogados em pouco tempo, contudo apenas aquele jogador que dedicou horas (e fichas…) diárias ao treino de cada elemento de um shmup pode chegar aos níveis superiores, onde repousam os maiores scores e as façanhas dignas de lendas (como jogar Ikaruga controlando duas naves, uma em cada mão).

Jogos hardcore jogados de forma casual são mais raros mas existem, um bom exemplo são os FPS com modo online. O modo campanha requer certa dedicação, mas o modo multiplayer pode ser jogado em partidas rápidas de alguns minutos. Conheço várias pessoas que nunca terminaram o modo campanha desses jogos: foi comprar e entrar no modo multiplayer de cara.

A confusão está longe de terminar. Microsoft e Sony entraram no negócio de “jogos casuais” e haverá uma nova enxurrada de games familiares sendo chamados de casuais. Clones de títulos do Wii serão criados e reclassificados como “hardcore” apenas por terem gráficos fodões e serem difíceis, mesmo que na essência permitam partidas rápidas e descompromissadas. As empresas vão usar e abusar das palavras “casual” e “hardcore” em suas campanhas de marketing até ninguém se lembrar o que elas realmente significam.

Mesmo assim, espero que meu pequeno texto ajude a esclarecer um pouco a situação para algumas pessoas – e a remover parte do preconceito que jogos casuais sofrem atualmente. Não vamos desmerecer os jogos casuais, lembre-se que a era de 8 e 16 bit que nós amamos está recheada deles.

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Ótimo Jogo, Péssimo Gameplay

Por Eric Fraga.

Todos nós temos aquele jogo favorito que, numa rodinha de jogadores, no meio daquele gostoso papo de qual o melhor jogo que cada um acha, dá aquela vergonha de admitir. Por que não conseguimos assumir? Excluindo o caso de quando o game se chama “Cho-Aniki”, qual o fator que te faz duvidar de sua própria sanidade (sexualidade, no caso do jogo supra-citado…) ao escolher um videogame tão ruim e coroá-lo como um favorito pessoal?

Amigos, acredito seriamente que a resposta está no gameplay. Um péssimo gameplay. Aliado a uma ótima idéia. Que combinação!

Vou começar por um não tão desconhecido e que, inclusive, irá demonstrar minhas fenomenais capacidades de atuação no cinema, na TV e no YouTube. Nosso terceiro vídeo da série Cosmic Cast, falamos sobre o ótimo Bioforge. Abrimos com o Danilo jogando um beat’em up, primariamente conhecido pelos seus péssimos controles – o que, aliado à falta de música durante um jogo em plena era 16 bit, garante momentos bem ruins com o controle do Mega Drive na mão. Esta foi minha linha de diálogo, ao ver Danilo jogando: “Sword of Sodan do Mega Drive? Não tinha nada melhor não???”. Sim, pessoal: eu estava mentindo.

Adoro Sword of Sodan. Na época, aprendi a apreciá-lo pelo “desafio da dificuldade” (apesar de não ser nada impossível), pelos personagens grandes e detalhados e, principalmente, pelo uso de poções, que podiam ser combinadas gerando efeitos diversos – positivos ou negativos – durante as batalhas. Quando joguei um dos melhores RPGs ocidentais já feito, Oblivion, imediatamente lembrei de Sodan (quem diria) quando comecei a fazer poções – claro que em Oblivion a coisa tem muito mais profundidade.

Adoro Cyber-Cop. É um FPS com estratégia para Mega Drive, que lembra muito Deus Ex – você leu corretamente. Original de MS-DOS, Amiga e Atari ST – ou seja, só computadores. O único port para console é justamente este para Mega Drive, única versão que conheci. A jogabilidade é bem complexa: inclui o controle em primeira pessoa do personagem e uso de itens/objetos no cenário bem no estilo adventure. Eu era louco por jogos de MS-DOS, mas ainda não tinha um PC – Cyber-Cop me lembrava os “jogos de computador” da época, justamente por sua complexidade e o jeitão sério. No console da SEGA os gráficos também são 3D, numa janela pequena. Até os objetos do cenário e inimigos são modelos vetoriais, o que deixa o jogo com slowdowns incríveis.

Mas o game apresenta elementos de stealth e espionagem muito interessantes – você é um agente infiltrado numa empresa suspeita de desenvolver robôs para uso ilegal. A partir desta premissa, o gameplay ganhou as características que o tornam similares com Deus Ex, como citado – só que estamos falando de um game de 1990. Dificílimo e desafiador, muito por conta do “painful gameplay” (é o título de um vídeo que achei para demonstrar para vocês, melhor impossível). Na época, terminei várias vezes, locava para o final de semana e jogava todinho. Ah, como tínhamos tempo livre e poucos jogos naquela época…

Adoro Heavy Nova. Este é um jogo para Mega Drive de luta entre robôs – ou melhor, organismos cibernéticos, para não ferir os sentimentos dos bichinhos. Meio beat’em up, meio fighting game – porque no final de cada fase tem um boss com uma luta mais longa. O jogo é muito bem-feito: os personagens são grandes, os cenários são bonitos, a abertura é bem legal e as animações são detalhadas.

Muito detalhadas. A ponto de estragar os controles, pois o seu robô não “desliza”, como é o padrão neste tipo de jogo; cada passo é animado e o controle se torna terrivelmente duro. Virar para o outro lado demora mais do que  nos melhores survival horror. O estrago está feito. Ah, mencionei que as músicas são ótimas? :)

Gosto de E.T. do Atari 2600. Mas não vou entrar em detalhes :)

Torturei* Danilo, Euler e Andrey e eles escaparam com vida do meu interrogatório porque decidiram falar no último instante quais os jogos “favoritos” deles.

Danilo foi o primeiro a confessar:

“Chega, chega, eu falo!!! Too Human, para Xbox 360! Esse jogo veio com meu videogame, fui obrigado a gostar dos controles meio esquisitos e dos gráficos ruins para next-gen! Eu não tive escolha!!! Joguei por meses e acabei gostando, até queria uma continuação! Agora pare de me dar choque!!!”

Euler resistiu um pouco mais, mas eventualmente começou a falar:

“Não aguento mais, tá bom!!! Jet Li: Rise to Honor, para PlayStation 2! É um beat’em up repetitivo demais, mas eu gostava da ambientação, fazia você achar que estava num filme B de kung fu! Me solta, eu já falei tudo que tinha pra falar!!!

Andrey cedeu rápido e me deu dois nomes, mas pediu alto em troca:

“É contra minha vontade, mas admito que Last Ninja 2, do TK90, estragava quase tudo pois em momentos cruciais da ação, era necessário uma volta no teclado para selecionar itens. Rambo II, para MSX, é doloroso jogar porque não usa a diagonal para controlar, como em Ikari Warriors. Ok? Falei tudo. Agora, quero minha imunidade assinada pelo presidente da Tec Toy.”

Danilo, ao escutar o acordo feito por Andrey, grita:

“Ei, ei! Eu quero imunidade também! Er… Nightmare on Elm Street, do NES!!! O jogo não explica o que você tem de fazer, os controles são “moles demais” mas se você colocar ele em minha frente, eu jogo até morrer! Agora… ONDE EU ASSINO???”

Vivemos a sétima geração dos videogames. Como nós do Cosmic Effect jogamos os jogos de ontem e hoje, para fazer jus ao banner do blog, percebemos que os games atuais, quando são ruins, não os são por conta de jogabilidade péssima (com exceção de Too Human?). Eles estão tão polidos neste ponto, os desenvolvedores tentam facilitar a jogatina para “aumentar a quantidade de gamers” que o gameplay acaba sendo fluido e amigável quase o tempo todo. Dá pra arriscar dizer que, as maiores pérolas neste sentido, estão no nosso querido mundo retrogamer. Mais um motivo que enriquece ainda mais e estimula a continuar desbravando o interminável universo dos jogos antigos, caros amigos.

E você, admita para nós: qual jogo você adora e que não tem com quem conversar? AGORA!

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*Nenhum retrogamer sofreu injúrias durante a confecção deste post.

Mass Effect 2 (PC)

O jogo mais elegante que você já viu.

Por Eric Fraga

Palavras-chave: crossover; qte; tps; rpg; épico. Mass Effect 2 conseguiu ser o jogo “Império Contra-Ataca” que a Bioware almejava – tanto no aspecto do gameplay quanto pela história “segundo ato”. Prepare-se para muita  e merecida  rasgação de seda.

Logo no início, ME2 apresenta uma característica que não vejo desde a quadrilogia original de Quest For Glory, adventure com elementos de RPG clássico da Sierra: nele, era possível importar o personagem para o capítulo seguinte. Na época, joguei até o terceiro desta maneira, mantendo os stats de meu wizard original.

Quem teve o prazer de jogar o primeiro Mass Effect e o manteve presente em seu PC ou Xbox 360, pode fazer o mesmo que em QFG com o seu personagem de ME1. Eu diria que os elementos importados são relevantes ao contexto dos jogos da atual geração: sua “personalidade”, especialização e um punhado de decisões – além do seu rosto customizado.

O editor de faces é excepcional. Razoavelmente flexível, dá pra deixar o Sheppard com a sua cara – ou pelo menos, a que você queria no jogo. Este é Eric Sheppard de ME1, no momento de sua “concepção” em ME2:

A introdução fantástica deixa o gamer que continua a aventura anterior a par dos acontecimentos, mas também cria uma situação que permite o novo jogador da franquia ficar bem à vontade com a trama. Veja o vídeo  que vem agora ou não – mas continue lendo. O  que importa mesmo, virá a seguir.

Começa o cruzamento de gêneros de sucesso da Bioware. Os elementos básicos dos RPGs estão presentes: nível, habilidades a escolher, especialização, upgrades de arma e armadura; só que todos eles estão devidamente encapsulados no sistema de combate.

Um exemplo sutil mas que representa bem o design da interface – arrisco-me a dizer – revolucionário: você comprou uma nova arma; o menu de escolha sempre explicita em qual alvo ela é mais eficiente, a partir de um pequeno texto. Durante a batalha, o alvo de sua mira exibirá, na parte superior da tela, o “life” de cada etapa da proteção dele:  shield, armor, barrier e, por fim, o health.

Tudo com uma simplicidade e eficiência pouco vista antes. Cada barra tem uma cor e estão sobrepostas na diagonal. Você troca de arma (ou troca a de alguém de sua party) de acordo com a situação do alvo no momento, sem perda de tempo com a interface.

O segundo e mais importante elemento da interface e que é a cereja no bolo deste crossover: a possibilidade de pausar a ação e tomar parte das decisões. Diferentemente de Fallout 3, não há Action Points – e não podemos atirar no alvo durante o pause. O momento turn based de Mass Effect se limita à execução dos bióticos (as “magias” do universo deste jogo), troca de armas e… girar a câmera para ver melhor o cenário (e fazer screenshots belíssimos…). Isso garante o equilíbrio entre a ação e o lado estratégico, cerebral do jogo. E, falando em ação, o esperado sistema de cover iniciado em Gears of War está aqui. É consagrado entre os jogadores, funciona bem e garante ótimos momentos de ação pura.

Se os elementos de RPG estavam muito bem inseridos no combate, qual surpresa a Bioware teria para os outros 50% de um role-playing game? Escute bem: simplesmente O MELHOR sistema de diálogos que você já viu – hands down.

Para começar, como é um jogo AAA, espere: a melhor dublagem e animação possíveis. As vozes de Martin Sheen, Seth Green e Carrie-Anne Moss (sim, The Matrix) mais uma penca de outros atores estão presentes, garantindo atuações acima da média. A voz de Sheppard masculino é muito convincente e pelo jeito, o cara é bom pelo menos como dublador. Mas o lado técnico não é o que mais surpreende: é a dinâmica de suas escolhas.

O vídeo a seguir demonstra muito bem as possibilidades que o diálogo permite – portanto, reforçando muito o elemento role-play. Nesta sequência, foi oferecido ao jogador um quick time event de moralidade renegade. Observe as mudanças de câmera e as interações dos personagens.

Você escolhe suas falas a partir de frases curtas, que contém apenas a idéia do que será dito a seguir; as opções são exibidas antes do outro personagem terminar de falar; mesmo assim, sua escolha já é permitida pela interface; após escolher, a animação prossegue no momento certo: ou quando quem está com a palavra termina de falar ou, até mesmo, ele poderá ser interrompido – caso sua escolha seja mais agressiva, por exemplo.

Isso já existia em ME1; mas, na continuação, a Bioware agregou quick time events durante o diálogo, em momentos, a princípio, imprevisíveis. Juntando isso tudo, é possível, por exemplo, impedir alguém de atirar em outra pessoa – pois os QTEs se traduzem na animação de uma decisão mais “derradeira”.

Estas decisões seguem o estilo paragon/renegade introduzido pela franquia: decisões paragon são mais amigáveis e lhe garantem status de bom moço; escolhas renegade traduzem o ódio reprimido do seu Sheppard. Renegade não quer dizer que o cara seja “mau”: só mais violento e rude. Em Mass Effect 1, haviam skills baseadas nos seus pontos de moralidade. Isso foi simplificado no 2: novas opções de diálogo surgirão de acordo com seu score de moralidade – e só.

Uma curiosidade: as feridas no rosto do seu personagem serão curadas aos poucos, caso seja ‘bonzinho’. Eric Sheppard era paragon total em ME1; mas agora, ele atravessou a campanha bem nervosinho e o score se equilibrou.

O brilho cinematográfico de Mass Effect 2 é fora de série, justamente por causa da maneira em que os diálogos acontecem. Não vamos nos enganar: mesmo em um RPG, nos preocupamos menos com a história e mais com o gameplay. Claro que as desenvolvedoras vêm de um longo caminho, inspirado em sua mídia mais próxima neste aspecto – o cinema – transformando os jogos eletrônicos em super-produções.

Dito isso, ME2 é um dos pouquíssimos exemplos em que a narrativa realmente envolve; você quer ouvir e participar (como nunca antes, por sinal) das conversas,  interessando-se por elas e pelos envolvidos. Voltando à época dourada dos PCs com seus adventures, os diálogos de Mass Effect 2 realmente importam para o jogo – e você se importa com eles. Dá até para se relacionar (sim, e com direito à achievements) com outros personagens, o que rendeu uma matéria na Fox americana e o apelido “Sex Effect”. Não vou abordar este assunto por aqui, pois está devidamente esmiuçado em qualquer fonte online.

O importante dizer é que as cenas e as possibilidades foram inseridas de uma maneira até interessante – mas isso ainda soa como algo que está em “fase beta” nos games, não se enganem.

Quando joguei ME1, ao pousar no primeiro planeta e pilotar o Mako – veículo terreno utilizado na exploração das superfícies – notei uma obscura similaridade com um jogo antigo o qual sou apaixonado. Na Normandy (a nave do comandante Sheppard), percebi a presença de um mapa estelar que também me trouxe ao passado, lembrando este mesmo jogo.

Digitei no Google: “Mass Effect Starflight”; nos fóruns da Bioware, os programadores já tinham sido questionados e admitiam ser fãs de carteirinha do antigo jogo RPG espacial de PC e Mega Drive e que, de fato, trouxeram diversos elementos para Mass Effect diretamente do clássico Starflight. Fiquei emocionado só de ler os comentários dos desenvolvedores: “…foram muitas noites em claro minerando planetas e descobrindo galáxias obscuras em Starflight, e de fato ele se tornou fonte de inspiração para Mass Effect…”. Claro, houve um “pequeno” update nos gráficos, vejam:


O gameplay variado de ME2 ainda inclui um minigame de mineração: vendo o planeta inteiro, é possível girá-lo e procurar por minérios em toda a superfície; os sensores detectaram algo? Solte uma sonda e continue procurando até esgotar as reservas daquele planeta.

Não há desafio neste minigame, mas achei-o estranhamente terapêutico e viciante, provavelmente pela bela música de fundo, por conta do visual sci-fi refinadíssimo e os efeitos sonoros agradáveis. Hackear computadores e abrir portas trancadas trazem dois minigames “de verdade”, com um certo grau de dificuldade. São bem divertidos, especialmente o joguinho onde é necessário “ler” blocos de linha de código de programação para burlar o “firewall”.

A trilha sonora foi composta por Jack Wall (um dos regentes do Video Games Live) que participou da trilha do primeiro capítulo. Ele sabia o que fazer: usou somente sintetizadores, por vezes old school, trazendo a ambiência sci-fi ao extremo. Trechos mais grandiosos contam com alguma instrumentação de orquestra, mas a base é sempre eletrônica. Para os fãs de ficção científica, é um deleite escondido.

No fim do dia, o que temos é, mesmo, o primeiro grande exemplo de um possível novo gênero, resultante dos third person shooters com os role-playing games. Mass Effect 2 é ficção científica em estado puro, mas é um JOGO: seus elementos de gameplay otimizados confirmam o esforço da desenvolvedora. Ele agrada os assim chamados hardcores e tem appeal para o jogador médio; tem gráficos e animações fora de série, comparável somente à Final Fantasy, God of War e MGS4; e, mesmo com os elementos de RPG um pouco escondidos, apresenta a melhor interface com o jogador sob este aspecto – com destaque para os diálogos realmente imersivos e que afetam seu gameplay.

Não deixe de presenciar o esforço da Bioware ao criar um jogo eletrônico com tanto esmero, em cada detalhe. Jogue, nem que seja por isso. Os caras que fizeram esta obra-prima amam videogames tanto quanto nós que estamos do lado do joystick. O título deste blog agradece à Bioware :-)

Trinta e cinco horas de jogo – foram daquelas em que não se vê o tempo passar. Agora é aguardar “O Retorno de Jedi” e levar mais este save adiante.

Quem não jogou, não veja este vídeo…

SCORE

GAMEPLAY: Dois gêneros populares genuinamente misturados e você nem percebe 5/5
GRÁFICOS: Não é o estado-da-arte da tecnologia, mas é na arte e design 5/5
SOM: Diálogos bem interpretados como nunca visto e efeitos sonoros apuradíssimos 5/5
TRILHA SONORA: Para quem gosta de “trilha sonora de ficção científica”, prato cheio e mais um 5/5
DIFICULDADE: Mediana, mas com a presença dos níveis hardcore e insanity a coisa melhora bastante 3/5

DADOS

NOME: Mass Effect 2
PLATAFORMA: Xbox 360 e PC
DISPONÍVEL EM: DVD
ANO: 2010
DESENVOLVEDORA: Bioware
DISTRIBUIDORA: EA Games

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A Reinvenção dos Platformers

A Reinvenção dos Platformers

Por Danilo Viana

O gênero plataforma é um dos mais conhecidos e amados entre retrogamers e foi moda nos anos 80 e 90. Desde a criação de Super Mario Bros. por Miyamoto, centenas destes jogos invadiram nossas casas. Alguns “meia boca”; mas muitos de excelente qualidade.

E não havia como ser diferente com uma premissa tão simples: ir do ponto A ao ponto B evitando inimigos, perigos e, principalmente, saltando uma interminável sequência de plataformas. Este objetivo era normalmente suficiente para garantir no mínimo um jogo agradável que nos fazia perder horas divertidíssimas à frente da TV e, no máximo, uma pérola encontrada no fundo do mar dos melhores jogos.O gênero plataforma evoluiu?

Mas, com o passar dos anos, o gênero sofreu uma mutação curiosa – ele não virou zumbi nem perdeu força mas, ao invés disso, transformou-se em algo diferente que garantiu a sua continuidade. Porém, de certa forma, o fez perder a identidade original. Estou falando dos novos jogos de plataforma como Prince of Persia pós Sands of Time e Devil May Cry (quem não acha que o segundo é um jogo de plataforma jogue DMC 3), jogos que são essencialmente platformers – já que envolvem saltos entre plataformas – mas em quase nada lembram os jogos que fundamentaram o gênero.

Esta mudança no gênero gerou um efeito colateral que considero interessante: a volta do antigo estilo em jogos que visam resgatar o gênero as origens e ao mesmo tempo lhe dar uma nova roupagem, a exemplo de New Super Mario Bros. e Sonic 4.

Mas entre estas duas entidades – os old platformers e os new platformers – nasceu o motivo deste post. A era atual de jogos comercializados online e a facilidade de divulgação pela web, fizeram aflorar desenvolvedores que podem ser considerados no mínimo geniais. Eles conseguiram reinventar o gênero, de verdade.

Não acreditam? Então talvez não tenham ouvido falar de Braid. Braid é um jogo criado em 2008 por Jonathan Blow – e não, ele não é o produtor, ele fez o jogo todo sozinho. E o que esse jogo tem de interessante? – você se pergunta. Simples: ele é um dos jogos de plataforma mais geniais já criados.

A premissa de Braid é simples: você deve ir do ponto A ao ponto B, evitando inimigos e saltando entre plataformas. Mas seu estúpido, isso é Super Mario com gráficos melhores, que porcaria de inovação é essa? Calma, eu só falei a premissa, não falei nada sobre o gameplay. Em Braid você pode voltar no tempo.

Agora me chateei… ISSO É CHUPADO DE SANDS OF TIME, amigão. Será mesmo? infelizmente você terá que jogar para desfazer essa impressão, mas vou tentar passar em minhas palavras o que torna esse jogo fantástico.

Primeiro, você pode voltar o tempo – quantas vezes quiser e por quanto tempo desejar. Na prática isso significa que você não morre, pois qualquer morte pode ser desfeita. O problema é que chegar ao fim da fase (o que pode ser feito muito facilmente já que você não morre) não lhe garante a solução dos puzzles nem a coleta de peças de quebra-cabeça que são necessárias para avançar no jogo.

Segundo, a volta no tempo está ligada diretamente a solução dos puzzles que mencionei. Diferente de Sands of Time onde a volta no tempo só permite desfazer uma besteira, aqui você usa a volta para resolver puzzles. Isso acontece através de objetos ou eventos em cada fase que afetam seu poder de voltar no tempo. Por exemplo, em determinada fase, objetos envoltos numa aura verde são imunes a volta no tempo – o que significa que eles continuam seu curso normal enquanto você está no passado; em outro momento do jogo, andar para a direita avança o tempo normalmente, mas andar pra esquerda automaticamente volta o tempo, mesmo que você não use seu poder. Estes elementos são difíceis de explicar, então vou lhes mostrar um vídeo. MAJOR SPOILER, esse vídeo contém a solução do mundo 3, então não veja se você pretende jogar este jogo, ou pelo menos veja o mínimo possível pra entender do que se trata.

Terceiro e por último, o jogo faz uma homenagem descarada aos jogos de plataforma do passado. Sei que isso não tem nada a ver com jogabilidade, mas é muito engraçado ver as referências óbvias e o jogo quase vale a pena ser jogado só por esse elemento. Feito para retrogamers.

É impressionante ver que um jogo tão genial foi obra de um único programador, com ajuda somente para arte e música. O desenvolvimento completo custou cerca de US$ 200.000 e levou três anos – uma verdadeira pechincha se comparado aos jogos típicos de hoje. O dinheiro foi usado basicamente para pagar o artista e os músicos – e para ele viver enquanto criava o jogo. Quem tiver a oportunidade de desfrutá-lo também verá que boa parte dos elementos de gameplay são tapas na cara dos designers atuais de jogos – dando verdadeiras aulas de como um jogo deve ser desenhado.

Outro jogo que me chamou atenção é mais recente, lançado em fevereiro de 2010. Trata-se de The Misadventures of P.B. Winterbottom. Este não é considerado tão inovador se comparado com Braid, já que herdo algumas características do mesmo, mas é igualmente genial se comparado a outros jogos de plataforma.

Começando pelo enredo – em P.B. Winterbottom, você é um baixinho narigudo que usa terno e chapéu e que tem como objetivo… roubar tortas. É isso mesmo, o senhor Winterbottom, astro do jogo, é um ladrão de tortas. Um belo dia ele encontrou uma “cronotorta”, uma torta que deu ao senhor Winterbottom poderes de controle no tempo (de novo?).

Em cada fase existe um determinado número de tortas e o jogador vence  pegando todas. Para conseguir isso, o jogador deve usar o poder de criar clones, poder adquirido no início do jogo quando Winterbottom come a cronotorta. Para criar um clone, o jogador deve executar qualquer ação que deseje enquanto pressiona o botão de gravação – ao soltar este botão um clone será criado e ficará repetindo a ação criada enquanto o botão estava pressionado.

Este parágrafo acima já é suficiente para mostrar como Winterbottom é genial – mas, como em Braid, este é um jogo que precisa ser jogado para que se entenda  como este elemento afeta o gameplay. Winterbottom pode criar clones simples cujo único objetivo é pisar em um botão no chão enquanto você passa por uma porta que se abre; ou pode criar um clone que dá cacetadas de guarda-chuva para que o jogador seja arremessado em uma plataforma muito distante para ser alcançada em um pulo – é possível até mesmo usar os clones de apoio, subindo neles para alcançar plataformas mais altas. Existem muitos outros elementos neste jogo e novamente eu apresento um vídeo que dá um pequeno gostinho do que eu estou falando, obviamente estejam avisados de spoilers.

The Misadventures… foi criado por Matt Korba mas, diferente de Braid, aqui ele teve financiamento de uma companhia para desenvolvê-lo. Mesmo assim o jogo teve origem em um projeto escolar, evoluiu para um projeto em flash até que chamou a atenção da 2K Games que deciciu publicá-lo. Então, foi fundada a The Odd Gentlemen, que ficou responsável pelo desenvolvimento. Korba não tinha devaneios sobre revolucionar a indústria nem nada tão grandioso; ele conta que muitos elementos do jogo como, por exemplo, os gráficos estilizados, são do jeito que são meramente por praticidade. “Eu não sou muito bom em desenhar marines espaciais nem robôs”, diz.

Estes dois jogos mostram como os platformers podem se reinventar completamente – e  ainda sim reter os valores que o consagraram como gênero favorito de muitos gamers. E que venham mais como estes – nós  jogadores só temos a ganhar.

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Phantasy Star e Mass Effect 2

Por Eric Fraga.

Apenas uma foto para “refletir”: duas pessoas jogando, ao mesmo tempo e no mesmo lugar, dois RPGs famosos e separados por duas décadas. É uma cena de diálogo, em ambos os jogos.

Clique para ver em alta resolução.

O jogo antigo, emulado no netbook do primeiro plano, é o marcante Phantasy Star. Famoso por diversos motivos, um deles o fato de adicionar elementos de ficção-científica ao gênero ainda neném na época. Também, por apresentar uma protagonista feminina, e não o típico ser masculino. O jogo ao fundo é Mass Effect, o segundo. Ficção-científica pura, puríssima, um jogo que só poderia ter sido feito pela Lucas Games ou pela própria Bioware. A desenvolvedora é certamente uma das mais apropriadas atualmente para desenvolver um jogo como este – sua experiência com a franquia favorita de 10 entre 10 nerds em Knights Of The Old Republic (o “KOTOR”) garantiu o sucesso da sua inédita franquia, Mass Effect.

Qual dois dois é o “melhor”? Qual dos dois é (“será”, no caso do ME) o mais influente?

Phantasy Star do Master System está sendo jogado por uma pessoa inexperiente em jogos, especialmente RPG de console de videogame. Como sua primeira experiência, ela está simplesmente adorando e já sente aquela vontade de voltar ao mundo de Algol (universo, eu sei, foi figurado :-) sempre que não está nele. Bom sinal. Para garantir o “efeito console”, ela está jogando num (bom) joystick com direcional tradicional (dica pra quem gosta de emular: Logitech Precision, um gamepad retrô fantástico) e áudio do Master System no modo tradicional do ocidente (sem o chip FM). Precisou de uma dica para comprar o roadpass (quem não precisa, ora? :-), mas está evoluindo bem.

Eu estou jogando Mass Effect 2, no PC, com toda glória gráfica da resolução máxima, do áudio 5.1, da tela grande e et cetera. Este jogo me provoca aquele efeito de um grande RPG: assim como a jogadora iniciante de Phantasy Star, eu quero voltar para o mundo de Mass Effect 2 (aqui também é universo, droga :-) sempre que possível. Quero jogá-lo, quando não estou jogando.

Ok, ok. Rasgação de seda à parte,  o que mudou de 1988 para 2010? Muita coisa ou, essencialmente, um RPG eletrônico “bom” tem o mesmo efeito sobre o jogador? Fica aí esta dúvida maravilhosa…

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