Fatman (MD)

Muita água rolou por debaixo da ponte, antes de Street Fighter II revolucionar os jogos de luta um-a-um. Heavyweight Champ, da SEGA, de 1976, é creditado como o primeiro jogo de luta deste estilo tão duradouro, mas não teve impacto até por conta da época. Karate Champ do arcade teria sido o primeiro a experimentar com sucesso a visão lateral, em 1984. Em 1989, um jogo de luta, conhecido pelos fãs do Mega Drive, com certeza detém pelo menos este título: o jogo com maior quantidade de nomes diferentes.

Fatman, como aparentemente ficou mais conhecido, é um jogo de luta obscuro portado para o Mega Drive japonês em 1990. Original de PC (Tongue Of The Fatman), no Commodore 64 e Amiga foi rebatizado para “Mondu’s Fight Palace” e, finalmente, no Genesis tascaram um “Slaughter Sport”. A desenvolvedora Sanritsu é a mesma que portou James Buster Douglas para o Genesis, aquele dos lutadores do tamanho da tela… Já no Genesis, a produtora Razorsoft, notadamente conhecida por lançar jogos controversos (Technocop, Death Duel), comprou os direitos da Activision (que era a publisher) justamente tentando aproveitar o liberarismo da SEGA of America dessa época.

Logo de cara, vemos uma versão lite de Jabba The Hut proferindo “Welcome to the Fight Palace” abrindo o maior bocão e mostrando a língua. O problema é que a boca do gordo está na barriga (Star Wars com… Kuato de O Vingador do Futuro?) e você já entra no clima fanfarrão de Fatman. É um joguinho de luta que não dá pra levar a sério, tanto que seu primeiro batismo foi “A Língua do Gordo” e não um “Combate Mortal” ou “Lutador de Rua” da vida, né?

Se você ainda estiver comigo, vai notar que o Fatman do Mega Drive, mesmo com essa aparente pegada mais leve, brincalhona, é aquele jogo que você precisa jogar bastante se quiser encontrar a diversão. Seu personagem, o Rex, é um dos poucos humanos que lutam no palácio. Seu desafio é lutar por dinheiro, enfrentando o Mondu The Fat Lord no final. O primeiro oponente é seu próprio color swap – numa luta para introduzí-lo ao jogo. E, também, responsável por afastar muitos jogadores, normalmente dando sensação de arrependimento de ter comprado, alugado ou mesmo trocado emprestado o cartucho.

Fatman é um daqueles casos em que o artista colocou um sonífero no cafezinho do game designer e, sorrateiramente, foi encher o jogo com quadros de animação. Sabe como é: se você assistir uma luta pré-gravada e o cara for um bom jogador, o negócio pode parecer um desenho animado. Estou exagerando um pouco, mas os personagens são muito criativos (destaque para o Bonapart, que é um esqueleto com o coração como único órgão) e realmente bem animados. Esse é o problema, e sem solução: um soco do seu personagem demora demais, e o pior, virar para o lado oposto leva aquela eternidade. “Tongue Of The Fatman” é anterior à era dourada dos jogos de luta e traz um detalhe curioso: a versão para Genesis ganhou a possibilidade de escolha de qualquer personagem (9 no total, sem contar os color swaps) no modo 2 jogadores e há alguns relatos de que seria algo inédito até então.

Voltando aos problemas de Fatman: ele é um jogo difícil, mas pelas razões erradas. A princípio, a impressão é de que os controles são ruins, muito ruins. A causa principal é realmente o fato das animações serem detalhadas demais, forçando o jogador a “assistir” todos os quadros ao realizar os movimentos. Isso não é novidade: Fantasia, também do Mega Drive, sofre do mesmo problema, por exemplo. Tanto que, logo na primeira luta, o jogador naturalmente “descobre” que deve focar-se em acertar voadoras no oponente, justamente pelo pulo ser rápido, sem uma animação mais elaborada – é possível, inclusive, pular em sequência apenas segurando a diagnonal. Tornou-se a estratégia mais natural para mim, pelo menos foi assim que consegui terminá-lo na época em que aluguei. Sim, passava o jogo inteiro pulando, tentando acertar voadoras, até o último chefe.

Os oponentes são o charme: uma mulher punk, uma galinha cibernética, uma gárgula (com um ataque chamado de “gas cloud”, no mínimo desagradável, se é que você me entende), “Bonapart”  (um mutante que “sobreviveu a um ataque químico”), “Buff” (irmão do Slimer do filme Ghostbusters) – dentre outros. Eles possuem ataques diferentes, como era de se esperar, mas até onde sei, a estratégia básica para vencê-los é sua voadora no tempo certo…

Existem habilidades especiais, meio “mágicas”, que podem ser compradas entre cada luta pelo seu personagem, exceto na primeira. A idéia não é muito comum, até onde sei, em jogos de luta deste tipo; dá pra considerar uma ótima adição, poderia trazer alguma estratégia. Pena que, por conta da dificuldade dos controles, quando o jogador solta um destes poderes, é necessário atacar o inimigo rapidamente; é frustrante quando você não consegue em tempo hábil e o efeito passa. A habilidade que considero mais útil é a cama de pregos (daquelas de faquir) que fica sobre a cabeça do oponente: ele não pode pular enquanto o efeito não passa. Ah, os oponentes também se utilizam dessas habilidades. Outra curiosidade: seu life não é renovado ao fim da luta; você deve comprar, através de dinheiro obtido a cada golpe desferido, energia e força de ataque extra, além de até 4 habilidades. Por exemplo: se terminar uma luta com o life no final e não comprar energia, seu personagem inicia a nova luta a um golpe da morte. Uma boa idéia do titulo, eclipsada pelos problemas já citados.

A trilha sonora não chama a atenção, são loops curtinhos e praticamente sem bateria. Alguns efeitos sonoros são ótimos, principalmente as (poucas) vozes – são bem claras, nem sempre era assim no Mega Drive. Bom… pessoalmente, acho algumas músicas muito boas, principalmente o tema que chamaria de “Mondu The Fat Lord Theme” – toca na tela em que o Fatman aparece em seu trono, com uma bela moça e uma sereia – que fica exatamente no mesmo local da Princesa Léia quando escravizada por Jabba em O Retorno de Jedi…

Acho a musiquinha bem climática, até bonitinha. Mas, hey, that’s just me :)

No final das contas, Fatman é um joguinho de luta com muito carisma e boas idéias, mas o elemento maior de atração num game deste tipo é a realização de controles eficientes, precisos, como Street Fighter II ensinou pouco depois. Talvez em um universo paralelo, sem o clássico da Capcom como parâmetro, Fatman poderia funcionar.

De qualquer maneira, se você gosta de um lance bem underground e jogos de luta… “Welcome to the Fight Palace”!

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