Ikaruga (X360)

Shoot’em up que testa sua ganância.

Por Eric Fraga

Jogos de nave, lá no fundo, representam meu gênero favorito (“oficialmente” digo que são os RPGs). Talvez por tudo ter começado com Defender no Atari 2600, jogar um shoot’em up traz o máximo de nostalgia no que se refere ao ato de segurar um joystick.

Ikaruga é um shoot’em up japonês com scroll vertical lançado em 2001 pela Treasure, continuação espiritual de Radiant Silvergun e original para arcades. Foi portado para o Dreamcast em 2002, Gamecube em 2003 e, finalmente, em 2008 ganhou a versão para Xbox Live Arcade. Não estou certo, mas acredito que o port mais conhecido seria o do Dreamcast, talvez porque o jogo original foi desenvolvido para a placa SEGA NAOMI (mesmo hardware do Dreamcast) nos arcades e também por ter sido lançado no Japão após a morte oficial do querido último console da SEGA.

Para quem não conhece, o gameplay deste jogo é divisor de águas para o gênero – que curiosamente nunca morreu mas infelizmente após o final da década de 90 teve poucos lançamentos e está fora dos holofotes. A idéia é genial e simples: sua nave possui duas polaridades: uma branca e outra preta. Você alterna entre elas pressionando um botão. Quando “Ikaruga” ou “Ginkei” (o nome das duas naves controláveis pelo jogador) está branca, não é atingida pelos tiros brancos e a potência do seu tiro branco num alvo preto é dobrada. Claro, tudo se inverte quando se polariza a nave. Também, quando sua nave é atingida por um tiro da mesma polaridade, ela absorve a carga para um supertiro teleguiado que pode ser disparado quando desejar. Quando você destrói um alvo da mesma cor de sua polaridade, ele despeja sua carga na direção de sua nave e você deve tentar pegar o máximo possível. Quando o alvo é da polaridade inversa, ele simplesmente não despeja nada. No topo disso tudo, tem a “chain”: destruir 3 alvos da mesma cor de cada vez, sem perder a sequência, te dá muitos, muitos pontos. E pontos neste jogo, no modo original, é importante até pra finalizá-lo pois só se ganha a primeira vida extra com 3 milhões de pontos.

Joguei-o inicialmente no console da SEGA em 2006. Recentemente, adquiri a versão para Xbox 360, disponível na Xbox Live Arcade. A motivação inicial desta compra foi puramente técnica: o jogo fica mais bonito na LCD por conta da conexão HDMI do X360. Pronto. Fora isso, é exatamente o mesmo jogo.

Clique para ver em alta resolução.

Então… me enganei. O jogo é outro. E o motivo é a rede da Microsoft.

Arcade, Dreamcast e Gamecube são “plataformas offline” – a pontuação do jogo é armazenada apenas no console/arcade onde se está jogando. A partir da geração 8-bits, a maioria dos gamers deixou de perseguir pontuação – o objetivo único era vencer o jogo, chegar ao final – poucos olhavam a pontuação que conseguiu. Durante a era Atari, até porque 99% dos jogos não tinham final, o lance era “zerar” o jogo – ou seja, atingir um escore tão alto que o jogo revertia a contagem para zero e a pontuação recomeçava. A pontuação era o medidor mais importante da capacidade do jogador. Até hoje, aqui no Brasil pelo menos, muitos gamers ainda costumam se referir a um jogo terminado como “zerado” – a expressão ganhou novo significado e permaneceu. Meu irmão costumava anotar seus escores de River Raid, Enduro e Defender na própria embalagem do nosso videogame (!). Depois de um tempo, os escores foram para um caderninho.

Este “caderninho”, na Live, é o leaderboards. Fazendo uso deste recurso, você passa a se posicionar num escore global, de todos os jogadores que compraram Ikaruga. As pontuações são divididas de acordo com os modos de jogo (easy, normal, hard e outros) e com alguns filtros (escores globais, semanais, e dos amigos somente).

Aí é que entra a tal “ganância”: lembra da chain? Pois então, manter a tal sequência aumenta a dificuldade de diversos momentos do jogo que são relativamente fáceis quando não se preocupa em destruir os alvos mantendo a tal chain. Está lá você, feliz por ter chegado na terceira fase (são apenas 5) sem perder nenhuma vida, e com uma excelente pontuação; você se empolga por ter conseguido passar os 20% iniciais da fase mantendo uma chain perfeita. Então chega um momento daqueles difíceis, cheio de tiros e inimidos na tela; e aí? Vai parar ou vai continuar? Tento manter a chain e me arrisco horrores a perder uma preciosa vida ou faço a estratégia que me ajuda passar o momento sem morrer? Essa dúvida paira toda hora enquanto jogo Ikaruga – por causa do leaderboard online. No Dreamcast, eu nem tinha ligado pra isso, sequer sabia como funcionava a chain… queria chegar mais longe no jogo e, quem sabe, “zerá-lo”. Irônico: literalmente, aquele nem era o objetivo.

Pois só fui mesmo entender o quão profundo Ikaruga é, mais do que um “simples shoot’em up revolucionário”, agora que tento perseguir minha pontuação. São centenas de milhares de escores do modo original, dificuldade normal, no leaderboard da live. Estou em modestos dois milhões e alguma coisa, nem vida extra consegui ainda. O primeiro lugar neste modo atende pela gamertag “Sa Suisai”. Ele fez trinta e quatro milhões de pontos. Os 100 primeiros colocados nos escores podem deixar seus replays online para qualquer um ver a jogada completa do cara. Desconfio que Sa Suisai pode vir a ser 1) um replicante ou 2) um replicante sem vida social.

Alguns pro-players de Ikaruga original criticaram este port por ter alguns inimigos em colocações diferentes e por isso não consideram uma versão perfeita. Curiosamente, um dos primeiros colocados diz detestar o port. Mas, ainda assim, jogou o suficiente pra ser o primeiro, por um tempo. Aposto que ele checava todo dia, se ainda estava lá em primeiro na Live e nessa hora esquecia que tinha de odiar a versão para Xbox 360…

Graficamente, o jogo é simplesmente lindo. Aliás, tradição e parece que obrigação de todo jogo de nave: adoramos jogá-los e adoramos olhá-los. O lance da polaridade é a marca do jogo e está 100% presente em cada cenário, criando uma ambiência harmoniosa. Os inimigos e sua nave quando estão brancos são meio azulados e quando estão pretos são meio avermelhados. O framerate é travado em 60, o jogo transcorre com fluidez completa do início ao fim. Os bosses não são fantásticos como um R-Type Final da vida, mas o jogo preza pela estratégia – o design visual dos chefes foi certamente concebido amarrado ao gameplay. A música tema é muito bonita e durante as 5 fases aprecia-se variações deste tema, variações climáticas – como tipicamente acontece nas trilhas de filmes. Existem outros pequenos temas em cada fase, mas o tema principal ouvido no início da primeira fase sempre volta salpicado e com outras tonalidades. Enquanto isso já chega a ser comum em outros jogos atuais, não me lembro de ter visto nada assim em jogos de nave.

Enfim… obrigatório para todo fã do gênero e dos que gostam de desafios genuínos. Apresenta uma profundidade pouco vista em jogos de nave, sem falar na idéia inspirada de simplificar a interface com o jogo e agregar (muito) valor com a idéia da polaridade. Dá gosto olhar pra este jogo e ver o que a Treasure fez pelos jogadores hardcore. Pena que, como a Team Ico e seu Shadow Of The Colossus, a desenvolvedora costuma sumir por anos antes de lapidarem a próxima pérola.

Curiosidade 1: Como a versão para Dreamcast só foi lançada no Japão e com poucas cópias, ela tornou-se cara e escassa. Com o lançamento do jogo na Live, o valor da versão retail baixou consideravelmente. A de Gamecube mais ainda, chegando a custar apenas 30 dólares no eBay.

Curiosidade 2: No Dreamcast, era possível girar a imagem em 180 graus passando a ficar full screen em telas LCDs de 16:9 – deixando a imagem gigante. Na época, um amigo professor Pardal tinha até idealizado um dispositivo que faria o tilt no aparelho de TV automaticamente.

Curiosidade 3: Sim, eu jogava (às vezes…) deitado no sofá com a cabeça a 180 graus da TV só pra ver a imagem gigantona :-)

SCORE

GAMEPLAY: Estamos falando do mais fino tipo 5/5
GRÁFICOS: Lindo como todo shoot’em up deve ser 4/5
SOM: Efeitos sonoros cuidadosos e eficientes 3/5
TRILHA SONORA: O tema do jogo é belíssimo, define o clima e tem um toque cinematográfico. Composta pelo presidente da própria desenvolvedora 4/5
DIFICULDADE: O jogo é honesto e verdadeiramente desafiador 5/5

DADOS

NOME: Ikaruga
PLATAFORMA: Xbox 360
DISPONÍVEL EM: Xbox Live Arcade (800 MSP)
ANO: 2008

* * *

3 Respostas

  1. Muito bom o post. Comprei o jogo na XBLA sexta feira e não tava entendendo nada a respeito das polarizações. Já tô indo ligar o x360!

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    • Opa Marcuz, valeu mesmo cara, você acaba de fazer o primeiro comentário no primeiro post do nosso humilde blog :) Brigadão!

      Ah, me passa sua gamertag, vamos ver se a gente joga junto qualquer hora dessas, o pessoal que joga Ikaruga anda sumido da Live. Me adiciona lá: EricFraga.

      Abração!

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  2. […] um jogo definido perfeitamente como “Ikaruga de plataforma”. Para quem não conhece Ikaruga, trata-se de um shoot-em-up vertical onde sua nave possui dois “escudos” – um é […]

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